Trauma: mãe de Ana Clara diz que jamais entrará em um ônibus novamente

Ana Pompeu, do Correio Braziliense

Juliane ainda está na capital federal em fase de recuperação

Juliane ainda está na capital federal em fase de recuperação

Juliane Santos, 22 anos, não sabe como vai seguir em frente. Uma das poucas certezas, no entanto, é jamais entrar em um ônibus novamente. Ela é uma das vítimas dos ataques ordenados por detentos do Complexo Penitenciário de Pedrinhas, em São Luís, em represália a uma operação da Tropa de Choque da PM no local. Em 3 de janeiro, a jovem estava no coletivo que fazia a linha Vila Sarney Filho, por volta das 19h30. No atentado, uma das filhas dela, Ana Clara, de seis anos, ficou gravemente queimada e morreu três dias depois. Mas a mãe só soube da morte da menina na semana passada, em Brasília.

Sob efeito de cinco tipos de calmantes, Juliane entende os motivos que levaram a família a esconder dela a morte da filha. “Eles foram muito corajosos. Eu estava muito fragilizada. Quando minha irmã me contou, saí do meu juízo normal. Mesmo com dor, me joguei no sofá. Não fossem as queimaduras, teria saído correndo, sem rumo. Estava desvairada”, diz. Ela teve 45% do corpo queimado e hoje vive uma rotina voltada ao tratamento, que inclui três visitas semanais ao Hospital Regional da Asa Norte (Hran), sessões de fisioterapia e exercícios físicos, atendimento psiquiátrico e psicológico, além de pomadas, óleos e comprimidos.

As drogas, no entanto, não são capazes de apagar as imagens daquela noite. “Lembro-me de tudo. Da angústia que tive antes de entrar no ônibus e da vontade de não ir. Do cara fazendo sinal e, já na escada, sacando uma arma. De pedir compaixão, mostrando as crianças. De correr e já não ver mais a Clarinha depois de atearem fogo. De me jogar no chão com a Beatriz (a outra filha, de 1 ano). De reencontrar Clara toda queimada, sentindo dor. Se eu gemia de dor, imagine uma criança”, conta. Com a voz baixa, ela diz ter sido essa a última imagem da filha.

No Maranhão, ela passou oito dias deitada. “Na primeira vez que levantei, aqui em Brasília, gritei tanto que acho que o hospital inteiro ouviu. É uma dor inexplicável. Não há remédio que dê jeito”, conta. Em dia de troca de curativos, o incômodo é maior. “Tenho que pedir ajuda para pentear o cabelo”, diz. Na última quarta-feira, a família gastou R$ 250 em remédios. A irmã foi demitida do trabalho depois de faltar 10 dias. A mãe também abandonou o emprego de doméstica para acompanhar a filha. Elas estão na casa de uma tia aposentada.

Por mais que os caminhos que a trouxeram à capital federal sejam tortos, talvez ela finque raízes por aqui. “Tenho medo de voltar a São Luís. Quero retomar minha vida, voltar a estudar, mas ainda não sei como vai ser”, diz. Pelo menos, enquanto durar o tratamento, que ainda não tem prazo para acabar, o endereço dela é