Por Carlos Lula
Com a chegada do período eleitoral, tem-se como primeira vítima a verdade. Predispostos a quase tudo pelo poder, os candidatos a cargo eletivos não se intimidam em lançar notícias negativas contra os adversários, de modo que a mídia é um dos espaços onde primeiro se inicia a disputa eleitoral.
Em razão disso, os partidos políticos e seus candidatos valem-se da Justiça Eleitoral para tentar sanar inverdades e barrar notícias negativas contra suas candidaturas. Nada mais natural, afinal, a tensão legalidade/liberdade permeia toda a atividade do Judiciário Eleitoral.
Isso porque ao consagrar a liberdade de manifestação de pensamento (art. 5º, IX, XIV), a Constituição Federal de 1988, garantindo tanto a liberdade de expressão quanto a de informação, também tratou de dar limitações a essa atividade em períodos eleitorais.
Expliquemos. Se pode pensar e opinar, por óbvio ao cidadão deve ser conferido o direito de expressar esse pensamento e sua opinião. A liberdade de expressão contém duas dimensões, compreendendo (a) a atividade de pensar e exteriorizar a opinião; (b) a possibilidade de utilizar os meios adequados à divulgação do pensamento. Com a chegada da internet, o exercício desse direito tornou-se ainda mais efetivo.
E ao lado da liberdade de expressão surge a liberdade de informação. Se antes era concebido como um direito individual, advindo de um Estado liberal que consagrava a liberdade de manifestação e expressão do pensamento, atualmente vem sendo encarado como um interesse coletivo, a que corresponderia um direito “coletivo” à informação, um direito da sociedade de ser bem informada. Assim, a liberdade de informação compreende também duas dimensões: (a) a liberdade de informar, dimensão individual; (b) o direito de ser informado, dimensão coletiva.
De todo modo, quer a liberdade de expressão, quer a liberdade de informação são valores constitucionais protegidos pelo direito eleitoral e servem à formação da opinião pública plural, fundamento de qualquer regime que se quer democrático.
Mas deve-se também levar em consideração que a liberdade de expressão não é ilimitada, sofrendo ruídos e informações do princípio da legalidade, de sorte que as exigências do regime democrático devem ser preservadas neste embate.
O princípio da legalidade deve, então, significar duas coisas: a) só lei em sentido formal e material pode limitar a liberdade de propaganda eleitoral; b) o conteúdo legislativo desta limitação deve ser proporcional, de modo a manter intacto o núcleo essencial da liberdade.
Assim, as normas restritivas do direito eleitoral, desde que proporcionais, não podem ser acusadas de afetar a liberdade de expressão e informação, garantidas pela Constituição Federal.
Todavia, é decorrência do princípio da liberdade a inexistência de censura prévia na propaganda eleitoral. O Estado, portanto, banca o direito de as agremiações divulgarem, no rádio e na televisão, suas plataformas políticas. Isso não permite qualquer tipo de interferência estatal, uma vez que a definição do conteúdo do programa fica a cargo dos candidatos e partidos, proibidas a realização de cortes e a censura prévia.
Por censura deve-se entender todo e qualquer ato de reprovação prévio que impede a divulgação da propaganda independentemente do motivo, seja ideológico, político ou moral. O que caracteriza a censura prévia é o exame do programa antes de sua veiculação.
O Estado Brasileiro não pode, por alegação de qualquer natureza, impedir a liberdade de expressão na propaganda eleitoral a partir do controle prévio do seu conteúdo. Assim, não são admitidos, não são tolerados, cortes instantâneos ou qualquer tipo de censura nos programas eleitorais gratuitos.
Impedir, portanto, que determinados assuntos ainda que desabonadores, contra determinados candidatos sejam sequer citados em matérias ou opiniões jornalísticas, portanto, é censura e faz-nos lembrar de períodos em que não convivíamos com a democracia. Permitir que a censura venha do Judiciário, órgão encarregado de fazer cumprir a Constituição Federal, é retrocesso que não se pode permitir.
Carlos Eduardo Lula é Consultor Geral Legislativo da Assembleia do Maranhão, Advogado, Presidente da Comissão de Direito Eleitoral da OAB/MA e Professor Universitário. e-mail:[email protected]