Decreto das armas: Pareceres na Câmara e Senado indicam excesso aos limites legais

Daniel Carvalho, Folha – Consultores da Câmara e do Senado elaboraram pareceres que indicam que o decreto que amplia o porte de armas editado pelo presidente Jair Bolsonaro nesta semana extrapola limites legais, distorcendo o Estatuto do Desarmamento.

Provocados pelos senadores Randolfe Rodrigues (Rede-AP) e Fabiano Contarato (Rede-ES), técnicos do Senado elaboraram uma nota informativa obtida pela Folha.

Eles citam, por exemplo, que o decreto extrapola seu poder regulamentar ao estabelecer uma presunção absoluta de que todas as 20 categorias que lista cumprem requisito básico para andarem armadas.

A iniciativa assinada na terça-feira (7) amplia o acesso a armas de fogo no país para 19 milhões de pessoas, concedendo o direito a grupos como políticos com mandato, agentes penitenciários, repórteres policiais e conselheiros tutelares, entre outros.

O Estatuto do Desarmamento exige que o pretendente ao porte de arma de fogo demonstre, no caso concreto, a efetiva necessidade do porte em decorrência de exercício de atividade profissional de risco ou de ameaça à sua integridade física.

Ou seja, o Estatuto do Desarmamento exige um exame individualizado, pela Polícia Federal, de quem almeja uma autorização de arma de fogo de uso permitido.

Para os consultores, se não fosse assim, o decreto poderia contemplar qualquer pessoa, entidade ou categoria, presumindo, de forma absoluta, que ela necessitaria do porte de arma de fogo para o exercício da sua atividade profissional ou para a defesa da sua integridade física.

“Como vimos, esse não foi o escopo do Estatuto do Desarmamento. Como o próprio nome dado ao diploma diz, o objetivo do estatuto foi o de desarmar a população, vedando o porte de arma de fogo em todo o território nacional. Por exceção, foram elencadas, de forma estrita, algumas categorias, pessoas ou entidades que poderiam obter o porte da arma de fogo”, diz a nota informativa.

O decreto também ultrapassa limites legais, segundo os consultores, ao ampliar os servidores da área de segurança com direito a porte de arma.

“Verifica-se que o decreto estende o porte de arma de fogo aos agentes públicos inativos. Em nenhum de seus dispositivos o Estatuto do Desarmamento confere o porte de arma de fogo a qualquer funcionário público inativo”, ressalta a consultoria do Senado.

“Veja-se que não se critica aqui o mérito e a razão das escolhas administrativas presentes no decreto”, afirmam os consultores.

“Com efeito, é possível vislumbrar a necessidade do porte de arma por aqueles agentes públicos, mesmo a inatividade, para sua defesa pessoal. Todavia, apenas alertamos que autorização não está prevista na lei.”

No entendimento dos técnicos do Senado, o decreto também extrapolou o poder regulamentar ao conceder o porte de arma de fogo geral e irrestrito aos colecionadores e caçadores, presumindo, de forma absoluta, que tais categorias cumprem o requisito de “efetiva necessidade”.

Outro ponto criticado é o fato de o decreto não exigir do residente rural o requisito de idade superior a 25 anos, bem como a comprovação, na prática, de que realmente precisa de arma de fogo para garantir a subsistência alimentar familiar.

O parecer da Câmara é mais enxuto. A consultoria da Casa aponta que o decreto se excede ao estabelecer as categorias que têm, automaticamente, “efetiva necessidade”.

Este parecer também diz que o decreto avança nos limites da lei ao querer avançar numa competência das Forças Armadas, responsáveis por disciplinar o porte de arma das praças.

O texto da Câmara também diz que o decreto é omisso em relação à autorização do porte de forma limitada no tempo e no espaço.

“Dessa forma, o decreto concede —de forma ilimitada no tempo e no espaço— o porte de arma de uso permitido a certas pessoas”, diz o documento.

Sem entrar em detalhes, o parecer diz que outros dispositivos do decreto suscitam dúvidas que exigem análise mais aprofundada.

Nesta quinta-feira (9), o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou que a medida tem inconstitucionalidades e que pode ser sustada pelo Congresso Nacional. Ele afirmou que tem dialogado com o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, para encontrar uma solução.

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