Sarney fala pela primeira vez sobre as mortes de Mariana e Diogo, criticando garantismo da Constituição

O ex-presidente José Sarney falou pela primeira vez sobre o assassinato da sobrinha-neta, Mariana Costa, que foi assassinada em 2016 pelo cunhado, Lucas Porto. O ex-presidente também tratou do assassinato do sobrinho-neto Diogo Costa, que morreu alvejado com um tiro no pescoço na última terça-feira (16). Ele escreveu sobre violência em sei artigo semanal intitulado “O Preço da Violência”.

“Em nossa família já fomos atingidos brutalmente, porque, como disse, ninguém escapa da violência; já perdi três sobrinhos-netos, vítimas do desprezo pela vida que assola o país. O primeiro, Augusto, sobrinho da minha mulher, filho do meu cunhado Cláudio Macieira, assassinado quando roubaram sua motocicleta, no dia em que ia receber o seu diploma de engenheiro – e quando eu era presidente da República. Ele tentou resistir e foi abatido com um tiro na cabeça. A segunda, minha sobrinha Mariana, quando hediondamente foi asfixiada. E o terceiro, esta semana, Diogo, filho de minha sobrinha Concy, covardemente morto com um tiro à queima-roupa, quando tentou falar com o motorista de um carro que o trancara. O assassino não deixou nem que ele se aproximasse. De dentro do carro sacou uma arma e o matou com um tiro no pescoço”, lamentou. Sarney lamentou a perda de Diogo e disse que sua mãe Kiola o acolherá no céu.

O blog segue se solidarizando com a família do ex-presidente pelas perdas destes jovens.

Mas o ponto central do artigo é: qual a solução para tanta violência e descaso pela vida? O ex-presidente reforça uma lógica que levou ao bolsonarismo: de que a violência é consequência da permissividade da Constituição de 1988 e a impunidade a homicidas. Lamentável que alguém que se diz tão democrata como Sarney reforce tal discurso falacioso.

Sarney diz que a Constituição dá um tratamento melhor ao criminoso do que à vítima. Mas é preciso separar criminoso de acusado. Talvez por isso, os governos dos Sarneys tenham tido tanto descaso com a barbárie em Pedrinhas, que sempre refletia em maior organização de grupos criminosos e mais violência nas ruas. Definitivamente, não é um tratamento bom que tem o criminoso no Brasil. E mesmo o acusado, muitas vezes já tratado como condenado, tem tratamento deveras rígido.

O próprio caso do assassinato do Diogo, demonstrou a importância do garantismo ao acusado e o devido processo legal. No momento inicial, tudo apontava para um suspeito: Ayrton Pestana. proprietário do veículo com modelo, cor e placa usada pelo assassino. A única pista que existia era o vídeo do momento da quase colisão dos veículos do assassino e de Diogo.

Problemática dos crimes violentos no Brasil: novamente o debate sobre endurecimento de pena e menos garantismo.

Não fosse o garantismo proporcionado pela Constituição ao acusado de um crime, poderíamos ter uma grande injustiça contra um inocente. Imaginem se não houvesse a possibilidade de habeas corpus, de recursos, ou se o acusado de um homicídio ficasse na penitenciária dividindo cela com homicidas condenados perigosos, o que poderia ter acontecido com Ayrton?

O próprio presidente Sarney já foi acusado de diversos crimes contra o erário e respondeu em liberdade graças ao garantismo da Constituição. E foi absolvido de muitos processos. O ex-presidente poderia ter ficado anos na cadeia respondendo por crimes que ao final do processo foi absolvido.

Inúmeros estudos no mundo sobre criminologia já determinaram que não é a dureza da pena, mas a certeza da pena que diminui a violência. Quanto maior a sensação de que o estado investiga, chega ao resultado correto e pune o criminoso, menor a violência. Dos 50 estados americanos, 32 preveem a pena de morte em suas legislações. O Texas e Missouri são os que mais aplicam a pena. Ainda assim, estes estados têm índices de crimes violentos semelhantes aos que não aplicam a pena.

No Brasil, mais de 80% dos homicídios não tem solução. Aí está o problema. A grande chance do criminoso não ser descoberto e não a gravidade da pena ou como se dá o processo é o que gera sensação de impunidade. O que temos é sucateamento da polícia científica e pouca qualidade do inquérito para chegar aos resultados dos crimes.

O outro ponto tratado por Sarney, que é o tratamento da vítima de um crime, pode ser pensado. E mais uma vez creio que o problema não é legislativo, mas de aplicação prática.

O estabelecimento de verbas de reparação ao dano é um dos efeitos da condenação criminal, previsto no artigo 91, I, do Código de Processo Penal. Creio que em 99% dos casos penais esse tema não é debatido nas audiências de instrução criminal.

Não acredito que seria uma solução viável o pagamento de uma indenização pelo estado aos familiares da vítima, pois poderia estimular crimes familiares, como nos crimes para obter herança.

Mas são situações para pensar. Como fazer com que a vítima possa ter uma melhor tratamento. Mas isto não passa por um endurecimento legislativo no que tange ao acusado. Como já demonstrado ao longo de séculos de estudo criminológico, esta não é uma solução para os crimes violentos.

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