Porque Castelo caiu

Por Nonato Reis

Agora que o pano da eleição caiu e que já se sabe quem é o cidadão ungido para governar São Luís importa mirar o retrovisor e fazer algumas considerações. Uma delas é tentar entender a derrota do prefeito João Castelo. Muitos assinalam que isso já estava escrito bem antes e que o resultado das urnas apenas confirmou a profecia. Pode ser. Mas a julgar essa assertiva como verda…deira, cabe então perguntar: por que estava escrito? A partir de quando Castelo selou o seu destino político? E sendo assim, qualquer adversário que o enfrentasse no segundo turno se tornaria prefeito, certo?

Talvez seja preciso ajustar-se melhor a lente sobre a paisagem política e refletir sobre esse tema com mais cuidado. Nos meus artigos de quase dois anos atrás, quando todos classificavam Castelo como carta fora do baralho, eu o via como protagonista da sua sucessão e, mais que isso, como favorito para ganhar a eleição. E por que fazia essa leitura? Por uma soma de fatores.

Mesmo sendo um político personalista e centralizador, Castelo é carismático, tem poder de sedução. Jamais poderia ser comparado a um Washington Oliveira, absolutamente insípido. Ou você gosta dele ou o rejeita. Tem um nome consolidado em São Luís e também em todo o Estado. Fosse candidato a governador hoje e já largaria com índice na casa de dois dígitos, talvez até mesmo superior a Roseana, que faz um governo sem inspiração.

Quando governador, Castelo promoveu realizações que até hoje chamam a atenção e ele próprio gosta de lembrá-las, porque sabe o apelo que isso produz na memória do eleitor. Some-se essas credenciais ao fato de ser o prefeito e ter a caneta que determina. Comanda uma máquina administrativa fabulosa que, se bem azeitada, pode operar milagres e até distorcer a lógica das coisas.

Neste caso, diante de uma conjugação de fatores tão favoráveis, o que deu errado então? Castelo perdeu a eleição por uma série de elementos combinados. Porém é uma falácia dizer que foi derrotado por si próprio. Afirmar isso é de uma injustiça enorme com ele e também deselegante com o seu adversário.

Na verdade o que abateu o prefeito foram dois fatores essenciais, um estrutural e sobre o qual ele tem participação apenas tangencial, e outro natural, e neste caso não lhe cabe nenhuma responsabilidade. O primeiro, já tão dissecado em meus artigos, é o cansaço do eleitor com esse estilo de administrar, herdado de Jackson Lago e que caracterizou a gestão pública da cidade por quase 25 anos. Castelo tem alguma responsabilidade sobre ele, porque devia ter percebido esse desgaste e procurado fazer uma administração diferente. Não o fez e assim deixou que a cova se abrisse.

O outro fator chama-se Edivaldo Holanda Junior, um jovem carismático que, mesmo não tendo uma boa oratória e sem demonstrar o preparo que se espera de um gestor moderno, soube se impor e captar o espírito de renovação, reivindicado pelo eleitor. Foi como juntar a fome e o prato de comida. Na reta final da campanha superou limitações e enfrentou Castelo nos debates com naturalidade. No último deles, promovido pela TV Mirante, apareceu com ar sereno, leve, descontraído. Isso, mesmo alvejado sob forte artilharia tucana. Castelo, ao contrário, era a imagem do cansaço, do nervosismo e do desânimo.

Mas, volto a dizer, é um erro imaginar que o prefeito perdeu para ele mesmo. Perdeu porque enfrentou um osso duro de roer. Perdeu porque do outro lado estava Edivaldo Holanda, um político que tem demonstrado enorme capacidade de conquistar votos. Na segunda eleição para vereador foi o mais votado de São Luís. Em 2010 se elegeu deputado federal e só na capital teve mais de 74 mil votos, mais até que a candidata a prefeita, Eliziane Gama, no primeiro turno deste ano, que ficou em terceiro lugar.

Fosse Tadeu Palácio ou Washington Oliveira, ganharia fácil, mesmo com todos os erros e equívocos cometidos. Tenho dúvida até se a própria Eliziane Gama seria páreo para ele. O eleitor teve pouco tempo para analisar Eliziane. Não sei se, avaliando melhor os seus discursos tão cosméticos, se encorajaria em depositar nela o seu voto. De qualquer modo Eliziane é um nome para depois.

Outro aspecto que serviu para derrubar a campanha tucana foi, sem dúvida, o VLT, transformado em mote da propaganda do prefeito no primeiro turno e desaparecido como que por enquanto no segundo turno. Não sei de quem foi a idéia brilhante de resgatar um projeto que passou anos sendo costurado no mais absoluto silêncio, como se fosse uma espécie de Calha Norte. Ao trazê-lo à luz da campanha, Castelo, que já enfrentava sérios problemas de credibilidade, ficou insustentável. Passou a idéia de que não deveria mesmo ser levado a sério, tal como o seu VLT.

Mas ainda assim, se não tivesse uma pedra, chamada Edivaldo Holanda, no meio do caminho, Castelo sairia das urnas com a reeleição garantida. Na verdade, o que determina o êxito ou o fracasso numa eleição nem é tanto os erros que você comete, mas a qualidade do adversário. A diferença entre Castelo e Edivaldo foi de 60.000 votos. Não é uma diferença tão grande, considerado o universo de votos. Em outro contexto, esse fosso jamais existiria.

No resumo da ópera, Castelo perdeu porque teve o azar de pegar um jovem político como adversário, que soube captar o sentimento do eleitor e conjugar o verbo no tempo certo. Perdeu porque dormiu no comando da máquina, deixando para acordar quando já era tarde demais. Perdeu porque, ao invés de selecionar obras concretas para mostrar ao eleitor, foi escolher justamente um projeto abstrato, irrealizável no tempo presente. Enfim, perdeu porque, quando devia dar maior destaque às realizações se ocupou em reeditar promessas.

Sai de cena, melancólico, menor do que sugere a história. Por 40 anos marcou a paisagem política do Maranhão com uma atuação em auto-relevo. Como deputado federal foi apagado do início ao fim. Como governador se redimiu ao fazer uma gestão realizadora. Nos mandados parlamentares seguintes voltou à penumbra. Dos discípulos de Sarney, foi talvez o de mais forte personalidade, mas jamais tentou lhe solapar a liderança por meio de golpes e atitudes menores. Afastou-se do patrono, quando viu que os caminhos se fechavam para ele, mas o fez com altivez. De Castelo pode-se dizer tudo – e muito ainda há que se falar sobre ele -, menos que não seja coerente.

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